farsa ambulante

Preciso confessar: sou uma farsa. Estou na faculdade errada, na cidade errada, vivendo no tempo errado. Ando lendo os livros errados, ouvindo as músicas erradas e frequentando os lugares errados. Sabe, não consigo mais escrever. Antigamente eu fazia isso com uma facilidade sobrenatural, e agora me arrasto pelos cantos da casa, criando personagens maravilhosos para um roteiro que não vai sair da cabeça. Simples assim.

Por que eu não tento consertar as coisas então? Porque sou covarde. Não tenho paciência pra me desviar para onde quero. Sou o tipo de espírito incontrolável, daqueles que vive somente para as horas vagas e que transforma toda rotina em caos. Não tenho o mínimo de medo do agora, o que me apavora é o amanhã. E o amanhã sempre se mostra ainda mais digno de pena do que o hoje. Se eu fosse sincera comigo mesma, assumiria que sou arrogante e massante. Julgo as pessoas a todo momento e consigo encontrar defeito até em gente santa. Talvez meu único encanto seja o que mais intimida, a minha capacidade de escarnecer de qualquer coisa, tudo é motivo pra despertar a minha paixão violenta pelo diálogo baixo, aquele que "faria corar até um estivador de porto", parafraseando Rochester.

Sou a filha de tempos loucos. Todos nós somos. Mas tem gente que possui aquela retidão de caráter que freia os impulsos destrutivos. Eu não sou assim. Me vicio facilmente em qualquer coisa que amenize a dor. Digo que não acredito no meio termo justamente porque não consigo viver entre o 8 e o 80. Ando na corda bamba todos os dias, procurando um limite que minha mente não encontra. Quero chorar, mas perdi essa capacidade depois de ter chorado tanto por coisas desnecessárias. Mas o que é necessário afinal? Ter um boletim cheio de notas 10? Isso eu já tenho. O que só reforça a minha vontade de provar para os outros que eu sou ótima. Coisa que eu estou longe de ser.

Hoje, mais do que nunca, me sinto um lixo. E é justamente porque minha vida é coroada de êxito. Por que tudo na minha vida sempre dá certo? Eu gostaria que às vezes o mundo não sorrisse pra mim, porque assim eu teria motivos para me depreciar, pra xingar o cosmo e não dar valor para nada. Porque eu não consigo valorizar tudo de bom que eu tenho. E ter demais, no meu caso, talvez seja uma maldição.

Falando assim, talvez eu pareça uma menina mimada, a "pobra menina rica", coisa que não sou. É só que.. eu sempre imaginei que o mundo fosse mais do que isso, e agora que estou realmente vivendo, vejo que a maioria das pessoas não vive, apenas existe, vegeta, cria raízes num local e nunca alça vôo pra terras longínquas onde a única certeza é a falta dela. Dá pra entender?

Eu quero emoção. Quero poder dar vazão à toda loucura que me atormenta desde que me entendo por gente. Quero conversar com as pessoas invisíveis que ficam sussurrando idéias estranhas na minha mente, que me deixam apavorada e ao mesmo tempo atiçam aquela curiosidade mórbida que toda pessoa sente pelo escuro. Quero ter pelo menos alguma certeza, algum tipo de paixão que só quem dá valor a vida pode ter. Quero escrever pras pessoas, pra causar algum tipo de comoção que a vida real não causa, mesmo que seja do meu jeito exagerado e desajeitado, com mudanças repentinas de assunto e humor. Eu quero a genialidade. Quero que as pessoas gostem de mim mesmo me conhecendo de verdade. Como todo ser humano, eu sempre quero demais.

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2 comentários:

John Garan disse...

Me alegro, pois Você voltou.

divagante disse...

um texto é bom quando a gente se identifica com ele. qualquer ser humando, por mais excentrico que seja, se identificará com o seu.

adorei o blog:)